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'Cenário de guerra': corrida contra o tempo no sul para conter a tragédia climática
O sul do Brasil "é um cenário de guerra", com cidades inteiras submersas e milhares de pessoas isoladas, na maior catástrofe climática da região, que até agora deixou 75 mortos e 88 mil deslocados, disseram as autoridades neste domingo (5).
Das ruas alagadas ou do ar, as imagens são devastadoras: casas com telhados pouco visíveis, pessoas que perderam tudo e o centro de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, completamente inundado.
Mais de 3.000 militares, bombeiros e brigadistas trabalham para resgatar pessoas isoladas, em muitos casos sem suprimentos básicos como água ou eletricidade. Também trabalham na busca por desaparecidos, que já são 103, segundo a Defesa Civil.
Domingo "será um dia decisivo para os resgates", sublinhou o ministro da Comunicação, Paulo Pimenta.
"É um cenário de guerra. Vai ter que ter o tratamento também no pós-guerra", disse o governador do estado, Eduardo Leite, junto com o presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, além de vários ministros.
O presidente viajou neste domingo ao estado pela segunda vez nesta semana para coordenar ações para mitigar uma tragédia que não para de crescer.
O governo federal vai "disponibilizar todo o recurso necessário" para a reconstrução, prometeu Lula, um dia depois de Leite solicitar um "plano Marshall" para o estado de 11 milhões de habitantes.
- Doações e hospitais de campanha -
Multiplicam-se os pedidos de doações nas 334 cidades afetadas, assim como as ações de solidariedade.
Eduardo Bittencourt, comerciante de 36 anos, contou em Porto Alegre como se organizou com um grupo de voluntários para resgatar pessoas presas em suas casas com picapes.
"As coisas estão muito complicadas, estamos ajudando quem podemos ajudar, mas é a lei da natureza", disse à AFP.
Efetivos do Exército trabalham na criação de hospitais de campanha, porque centenas de pacientes tiveram que ser retirados dos centros de atendimento médico.
Das escolas às prisões, todos os tipos de infraestruturas foram afetados.
O abastecimento de água está interrompido em 70% de Porto Alegre – com quase 1,4 milhão de habitantes – e de sua região metropolitana, que tem cidades inteiras submersas, como Canoas, Guaíba e Eldorado.
Nas ruas do Guaíba, hoje transformadas em rios, centenas de lanchas, botes infláveis e jet skis vão e vêm sem parar resgatando moradores presos, molhados, sem energia elétrica.
E as águas avançam incontrolavelmente em direção à metrópole.
Segundo a Prefeitura, o nível do rio Guaíba localizado na cidade marcava 5,30 metros, acima do recorde de 4,76 metros registrado durante as enchentes históricas de 1941.
- De caiaque e a nado -
Rosana Custodio, enfermeira de 37 anos, conseguiu sair na quinta-feira de casa, em Porto Alegre, e chegar com a família na casa da sogra.
"Meu marido colocou minhas duas filhas em um caiaque e remou com uma 'tacuara'. Eu e meu filho nadamos até o fim da rua e começamos a caminhar com água até o pescoço", disse ela à AFP em mensagem de WhatsApp.
Mas na sexta-feira a história se repetiu. "Fomos resgatados por uma lancha de amigos". Desde então, está com a família em um abrigo. "Perdemos tudo o que tínhamos".
Assim como ela, quase 17 mil pessoas foram alojadas em abrigos.
A situação excepcional deixa Porto Alegre praticamente sitiada.
A Polícia Rodoviária disse à AFP que o acesso pelo sul está cortado a cerca de 15 km, enquanto o acesso à cidade ainda é possível pelo norte.
O aeroporto internacional de Porto Alegre, cuja pista está submersa, está fechado por tempo indeterminado.
- Mensagem do papa -
No Vaticano, o papa Francisco enviou uma mensagem de alento à população do Rio Grande do Sul.
"O Senhor tem os falecidos em seu coração, conforta os familiares e aqueles que tiveram que deixar suas casas", disse ele em frente à Praça São Pedro.
Foi o "coquetel desastroso" da mudança climática e do fenômeno meteorológico El Niño que favoreceu as chuvas devastadoras que atingiram o sul do Brasil e outros eventos extremos, disse à AFP o climatologista Francisco Eliseu Aquino.
Porto Alegre, cidade fundada por imigrantes portugueses em 1772 e localizada no meio de uma enorme bacia hidrográfica, desenvolveu-se sob a influência de seu porto, fundamental para o crescimento do Brasil, informa a Corporação Andina de Fomento (CAF) em seu site . Hoje essa bênção se transformou em infortúnio.
A província do Rio Grande do Sul alertou sobre o perigo de mais deslizamentos de terra ou desabamento de estradas, que já deixaram inúmeras rotas cortadas em todo o estado e também na vizinha Santa Catarina.
O.Krause--BTB